quarta-feira, 30 de novembro de 2011

As coisas vão aparecendo sobre as manchas e entre elas.
Elas aparecem e com paciência, o espectador da obra pintada e desenhada vai interagir e alimentar o seu arsenal interior de imagens, para que possa gerar mais conhecimento, conjugando-as com aquelas que já possui dentro e bem fundo.
O que é de dentro vai ser exposto na medida das ações que possam gerar a partir desse processo de apreciação.
Também participo desse processo pós fato, já que é para mim, impossível não rever e ver outras figuras saltitando pelo plano pensado definitivo.
Na nossa história humana e bela, nem isso tudo é definitivo.
Dúvida é luz.
Definitivo - sem a menor sombra produzida por alguma dúvida - é o amor que tudo isso calça e causa, tão fundo e bem dentro

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Pedagogicamente assim


A pedagogia do esquecimento.
Informa-mo-nos e esquecemos rapidamente aquilo que passa e passa num instante.
Instantâneo.
Agimos no instante brevemente posterior à informação.
Reagimos à ela num zás.
O zás que vai tornando-se esquecimento sublime, de tão guardado no fundo que fica.
Todas as informações são guardadas na máquina computadorizada - cabendo num chip - item por item.
A nossa máquina cerebral esquece.
Guarda e esquece.
O esquecer é essencial para que possamos seguir fazendo e acontecendo a partir de alguma coisa boa, alguma coisa que tenha uma beleza, uma superfície bonita.
Aquilo que se lembra vindo do bem fundo, pode gerar insegurança, tristeza, feiura.
Lembramos por pirraça, por înveja, ciúme, agredindo as coisas da gente, impulsionando os sentidos para agredir o que é do outro.
Esquecer faz sentido, mesmo que pareça politicamente incorreto.
Com certeza, os espertalhões contam com o esquecimento da gente para tirarem proveito de todas as situações que lhes possam gerar renda.
O fazer os pontos da rendeira é instintivo, muito mais do que lembrança, já que ela vai pontuando como aprendeu a andar com bicicleta.
Os espertalhões contam com o esquecimento.
Eu me esqueço no presente, me esqueço no instante, esqueço-me egoista.
Dizem que as coisas guardadas aparecem em forma de doenças e de protuberâncias na pele e nos órgãos.
Dizem, pesquisam, lembram e para não esquecerem, publicam.
Também publicam para que a gente se lembre e possa explorar num momento de inspiração falante.
O dizer é a pedagogia do zás, fazedora e acontecitória.
Quero me esquecer assim, vendo além da janela da parede monetária, enxergando além das coisas que as nuvens mostram, olhando para a história contada pela sua pele, esquecendo-me mais velho e mais moço, esquecendo-me no desenho da minha camiseta que hoje é minhoca pisada e amanhã será paralelepípedo 

domingo, 27 de novembro de 2011

O pano vive e reina


Acabo de enrolar um tecido pintado com as cores das fábulas.
O desenrolar do pano vai trazer a chance de novas figuras saltarem do seu silêncio predisposto.
Não nos vemos ainda, já que vejo apenas o verso do tecido em reviravolta cilíndrica.
Sem pressa, a caneta fará a parte dos contornos pretos.
Vou guiar a minha mão abrindo caminho para a passagem das coisas.
Um canal de seiva densa e bruta, já que leva o sangue original de cada peça.
Não saberei jamais como se dá esse processo de surgimento dos seres, que agora tornam-se representados, mas isso é apenas curioso e eu julgo menos importante.
O que importa mesmo é a exportação dos seres.
A partir do instante que aprecem em detalhes e contornos, serão para sempre lembrados, vivendo nesse novo plano.
Meu plano é que o vagaroso desenrolar do rolo, produza um resultado final com harmonia entre as partes.
Quiçá possamos também nós, sermos muito equilibrados nessa composição terrestre, onde nos dispomos com bermudas, calças, vestidos, meias sortidas, túnicas, sapatos, dorsos dos pés, agasalhos, camisetas sem mangas, corações arpoados, mentes brilhantes e doação permanente.
Uma multidão de diferentes, respeitando o espaço justaposto, onde cabe o um e cabe o outro

sábado, 26 de novembro de 2011

A nuvem doura


De vez em quando observo as nuvens.
Na estrada elas adquirem movimento e vão transmutando as figuras que nelas enxergo.
Tenho olhado manchas coloridas, postas na realidade prática por uma figura de beleza fantástica, que trava a batalha pictórica - ela e o tecido - vencendo-se definidora do próprio encanto.
Eu, oficineiro tracista, o que faço a partir dessas formas é apenas deixar aflorar as figuras com os traços pretos feitos à leves penas.
O que fico a pensar curioso, é no desejo que essas figuras têm de aparecer com aquela determinada forma e posição.
Onde estavam antes da maestrina propor as manchas?
Curiosidade minha.
Você vai me dizer que elas estavam no meu cérebro desde sempre.
Dir-te-ei que não.
As sedutoras manchas é que guardam as figuras, uma a uma.
A maioria delas são seres vivos dos reinos, vegetal e animal.
As linhas são como suas vértebras, suas ranhuras e suas menbranas, guardadas por um tempo, até transparecerem para esse mundo visível, o nosso.
A coisa se passa assim, simples encantamento que encanta as figuras nominadas.
Redescoberta da roda, que vez por outra, aparece na mancha.
Corações são compostos pela tinta que doura

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Excretando exercícios


Eis uma equação bem simples.
O nosso sistema capitalista, neo liberal, nos educa para sermos bons consumidores.
Participando de muitas palestras e reuniões, tenho percebido que nós professores, temos o desejo e a necessidade que todos os alunos-sujeitos sejam curiosos, observadores, detalhistas na riqueza que cada coisa sugere, que tenham ânsia pelo saber, sejam estudiosos e aprendedores - portanto - que sejam como professores.
Pensando que a nossa educação passa por problemas complexos, pensei em unir esses dois conceitos, num exercício de imaginação vulgar e alucinada, mesmo sabendo que esses sujeitos terminam a escola básica com dezessete anos.
Nesse exercício simbólico, os sujeitos seriam consumidores de livros, se energizariam com o conhecimento produzido e excretariam revoluções

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Alma urbana


A querida deu-me a alegria de observar que desenhar não é uma tarefa tão simples como eu julgava.
observando uma pergunta da aluna na prova de redação, dei-me conta que escrever também não é tarefa tão fácil.
Deu-me vontade de explicar que para ler um texto o interpretando, é preciso acompanhar o significado de ada palavra e ir aos poucos extrapolando os seus limites significativos.
Devemos nos embrenhar por entre as múltiplas significações dos verbetes usados em sequência e buscar extrair da somatória deles a história que deseja ser contada e praticada.
Por exemplo, se o maluco beleza diz: Eu gosto da cor leite!
O que o maluco quer que a gente faça?
O gosto pode vir do cheiro do gado feminino, assim como o branco da pintura sugerida, pode ser o início de um dia bonito regado a café da manhã com pão na chapa.
A cor leite inspira a nossa necessidade do campo e para isso, é necessário que ele seja pintado no nosso corpo e na nossa alma urbana.
Ontem pus-me a pensar na quantidade de cobertura asfáltica e cerâmica com a qual estamos impermeabilizando o nosso solo.
Anteriormente já foi sítio, ou fazenda.
E pensar que fazenda é um pedaço de tecido para se fazer vestido.
Acabo de tirar meu tênis e colocar meus pés para borbulharem na avenida principal

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Meu erro


Parecemos idiotas.
Lemos cada texto bonito, uns livros difíceis, sabemos umas coisas complicadas e seus porquês.
No final e no meio das contas o que vale mesmo é o quanto vai se ganhar com o comércio das coisas.
Um cinzeiro custa um real, porém na nota vale mil, dólares.
No final e no meio das contas vale o comércio e o lucro.
A produção é para os idiotas do meio inverso.
A produção parece-me valer mais.
A produção de uns traços imaginando figuras sobre uma pintura fantástica.
Tudo isso vale muito, assim como vale um abraço num ribeirinho mulato e magrelo, um aperto de mão no índio vermelho e a auto observação desse artista magrelo, branquelo e enrugadinho, no espelho do banheiro pequeno.
Ver-me mais velho instigou-me a pensar sobre o quanto é importante para o mundo o vale tudo pelo dinheiro e principalmente pela grana mais fácil.
Pensei também na minha necessidade de brincar com as palavras e dizer as coisas que eu acredito.
As coisas da minha crença, sem pecado.
Acredito no bom dia, na elegância e na boa educação.
Uma querida observou que até nas situações que pedem palavrões sonoros, eu falo: Caramba!
Caramba! Eu acredito na idiotice dos que sabem sobre a esperteza dos malfeitores.
Para os malfeitores, os meus erros 

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Dobra que dobra o sino



Dobraduras são mais fáceis quando se vinca bem vincadinho o papel.
Passa-se a unha sobre a dobra, por mais que isso possa causar arrepios.
Vinca-se e a dobra aparece como mágica, num toque, num gesto.
Disse aos meus alunos que ainda era tempo de querer ser curioso na sesxta, ou na sétima série.
Todos passaram a produzir com dobras no papel quadrado, uma pirâmide de base quadrada.
Uma estrela com quatro pontas nasceu de outras duas tiras retangulares, dobradas uma ao contrário da outra.
Os contrários unindo-se para originar a fonte de luz, posta sobre a pirâmide anterior.
A base é a mesma, mas as formas de pintura, soam as mais diversas.
Eu adoro essa forma de trabalhar antiga, onde se parte do modelo.
O que se consegue a partir desse inicial processo, é surpresa em cima de surpresa.
Pudéssemos descrever as várias formas pictóricas e gráficas, ficaríamos felizes para sempre com os resultados.
A felicidade eterna não nos é possível, portanto, fiquemos com os momentos e com a possibilidade constante de imaginarmos inúmeras coisas sem modelo.
A curiosidade vai dar conta dessa empreitada, mesmo que dessa forma ainda paire um modelinho escondido nas entranhas da criação.
Nascemos e desde então nos sujeitamos a sermos sujeitos inspirados pelo que vemos e sentimos por todo corpo.
Do nosso jeito dobramos os materiais que nos são impostos.
Dobro a minha cintura e danço do meu jeito atabalhoado e engraçado.
Danço na sua frente e no seu lado.
Danço de dançar colado.
Colado como a estrela que enfeita a árvore modelada pelo pinheiro.
O meu modelo de conduta pauta-se pelo vinco fora de moda que é a dobra da minha barra.
Dançamos sem movimentar um nada, movimentando tudo

sábado, 19 de novembro de 2011

Calçada larga


Muito ouro talvez nem seja muito.
Cinquenta anos de duração de pares pertinentes.
Pares que andam multiplicando seus afetos na alegria dos sinais: os doze, ou ainda mais.
Leões, touros, peixes, gêmeos sagitariando em aquários, capricórnios escorpinicando as libras das balanças das virgens, áries sem o câncer da discórdia.
Multiplicação dos pães para saciar a fome de semelhança nas diferenças.
Ouro dos sábios.
Reclino e inclino meu rosto sobre o seu colo e o seu ombro para colar meu sinal no seu.
O céu e o seu desenho feito com estrelas motivam os humanos para a interpretação dos mapas daquilo que é sentido mais do que sabido.
Ouro dos sábios.
Peço que as latas sejam meu material de modelagem e que ajam dentro da minha sabedoria.
A minha sapiência do gosto é o papelão e a fita crepe.
Com esses sinais eu faço o impossível para descrever-te na sua quadrimensão.
Papelão e cola com pequenas linhas feitas a pó de ouro.
Assim calças a calçada da minha avenida estreita

quinta-feira, 17 de novembro de 2011


Última aula para a turma do nono ano.
Nessa instituição não haverá mais aula de Arte no próximo ciclo de estudos.
Tecnicamente não estaremos mais juntos na possibilidade oportuna da criação e da utilização dos mecanismos da imaginação.
Ao lembrar-se disso, uma das meninas que eu vi nascer e tive a chance de conviver durante as aulas por oito anos, trouxe à cena a primeira vez que ela me viu.
Naquele dia, entrei na sala onde ela estava sentada num círculo de amigos da sala da pré escola e cantei uma canção - inventada na hora - que falava sobre a matemática que estava escrita na lousa.
Contei rapidamente para os alunos sentados perto da gente que numa festa de formatura do terceiro ano, um aluno do primeiro ano do ensino médio me encontrou e cantou uma música que eu não lembrava.
Nem a melodia, nem a letra.
Ela cantou a música inteira.
Falava de uma galinha inventora.
Enquanto ele cantava lembrei-me das cadeirinhas da saletinha do pré na escola de Campinas.
O aluno, agora grande, não esqueceu da canção composta quando ele era bem pequeno.
Fomos todos pequenos e agora crescemos, num salto gigante entre a fantasia fabulosa e fábula fantástica, que  representa tão bem a nossa entrega total aos fatos todos e não só esses

quarta-feira, 16 de novembro de 2011



Eu estava andando sobre a calçada.
Um pássaro atravessou a minha frente num voo rasante e foi embora para o outro lado da rua.
Logo pensei em descrever essa cena nesse texto.
O pássaro veio de um terreno sem construção entre tantos prédios, estacionamentos, bancos e lanchonetes.
Gosto de imaginar vocês visualizando a cena em sua magnitude fabulosa e espetacular.
Um zás de pássaro me fez imaginar que se eu estivesse um metro a frente, o passarinho tinha acertado a minha face esquerda.
E lá iríamos nós, eu e o pássaro, voando e brincando de atravessar avenidas

terça-feira, 15 de novembro de 2011


Você estava nascendo e ele já tinha uma lambretta.
Esse você pode ser eu, pode ser você, o que importa é que ele tinha uma lambretta e já desenhava com nanquim.
Hoje podemos ler e o lemos.
Ele já fazia composições com efeitos ópticos, sangrando as figuras pretas e revelando quadrados e ratângulos justapostos.
Seus desenhos e pinturas foram usados para estampar tecidos que embrulham pessoas com beleza colorida.
Essa beleza que é dolorida de uma dor intuitiva e prazerosa para quem a vê de longe, de perto e nunca tão dentro.
A beleza mais pra dentro é uma beleza desnecessária, na medida que é uma beleza que já o é deus de sempre.
A beleza da lambretta é uma das que vai e vem e vai e volta.
Volta a ser beleza na velhice do ser que pinta e que encanta novamente com as justaposições e sobreposições das camadas de tinta.
Achei bonita a última camada que emoldura a figura abstrata, agora escolhida.
O cineasta espanhol nos ensina e lemos bandeiras, paredes e piel.
Se gostas tanto dele deverias vestí-lo.
Estou achando bonito descrever uns traços sobre a pintura bela que atrai as linhas.
São elas ali, vestindo, habitando a pele da pintura

sábado, 12 de novembro de 2011

A predileção


Um menininho ao ver numa sala pequena um monte de placas de papelão, perpendiculares ao chão e desenhadas com traços pretos formando figuras, revelou:
Tia, é assim que você aprende a contar as suas histórias, né?
Conseguem imaginar a quantidade de histórias que passou pela cabeça dele para que proclamasse essa frase em alto e bom som?
Parece aquele outro menininho que ao ver a demolição de uma casa, exclamou para o pai:
Papai, estão construindo um terreno.
Essas são as mágicas revelações surgidas da racionalidade humana.
A razão que suporta a tese que a casa tem quatro paredes, um chão e um teto.
Sim, existe o terreno, a casa, as placas de papelão, o peixe, a jabuticaba, a dona benta e a benção que é extrapolar o limite do significado de cada uma dessas coisas.
A casa se casa com as placas que casam-se com o B da benta, que encanta-se com os peixes que desfilam pelo riacho onde a narizinho reina.
Assim revela-se o dia em que as coisas abrem toda a possibilidade para serem redescobertas e reconhecidas.
O reconhecimento se faz na medida que as nossas antenas, sintonizadas deus de sempre, casam o preto com o preto e com o brilho que o preto tem

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Coelhos e cartolas

Uma folha de papel totalmente preenchida com texturas diversas, grafadas pelo atrito do grafite com chão, parede, muretas, pastilhas, moedas e outras coisinhas mais.
Sobre essa nova superfície impressa no papel, desenhamos e colorimos com uma camada suave da matéira do lápis de cor.
Quanta informação pode guardar uma superfície áspera?
Saltar aos olhos as figuras decorrentes dessa impregnação, depende de uma região específica do cérebro.
Parece que foi assim que o senhor Michelangelo já previa a figura dentro do bloco de mármore.
Antevendo a figura, ele apenas retirava da pedra aquilo que restava e sobrava a peça.
Já o menino de Vince, via as figuras saltando das manchas de bolor nas paredes e nós,  pertencentes a essa vida bem vivida, vemos figurar as coisas nas densas nuvens que vagam  pelo céu que nos cobre.
Dar o mínimo de atenção para quem não tem nenhuma, já ajuda bastante na providência de um sorriso, durante o dobrar das folhas quadradas que almejam ser um sólido estrelado.
Estrelar a solidez de um sistema líquefeito não é tarefa simples.
Dar um pouco de atenção, já que de atenção dependemos todos, inclusive nós, que atentamos tanto para essas coisas de pouca importância.
Acabei de ver um documentário sobre a pedagogia do oprimido e sua vinculação estreita com a solidariedade, bondade e dedicação ao outro.
O conhecimento depende da necessidade e a necessidade desse sistema quadradinho que nos enquadra, é muito distante da união e muito mais próxima da individualização, do cada um no seu quadrado.
Olho bem de perto a questão estudada e vejo que devo colocar as mão no ombro daquele que olha pro céu e vê um coelho, bem perto da cartola

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Reconhecendo


Alguém me levou a pensar sobre a dificuldade que é dar aulas sobre Arte.
Quero dizer que essa dificuldade não é maior, ou menor do que ensinar matemática, ciências, ou língua portuguesa.
É uma dificuldade de natureza diferente.
Diferente por natureza e por desenvolvimento.
Pensei que o que hoje interessa aos que pensam questões para exames seletivos, é a ruptura com a tradição clássica acontecida no final do século dezenove e que propiciou o surgimento das vanguardas no século vinte.
Essa ruptura tirou do artista o peso da aptidão para os trabalhos manuais e gerou a possibilidade da criação de imagens jamais pensadas até então.
O retratar a realidade com maestria deu lugar a sutilezas mentais que transformaram a própria realidade.
A frase de Klee expressa magistralmente essa ideia:
Eu não represento o visível, eu torno visível.
Esse poder de criar uma nova natureza com naturalidade é a essência do que deve ser apresentado e representado às pessoas, no exercício constante da observação sensível de todas as coisas e situações.
Essa capacidade - com certeza auxilia - nos fazeres todos de quem permanece vivo, para transformar tudo aquilo que precisa ser transformado.
Fazer aquilo que a gente já sabe fazer faz tempo, não nos desafia suficientemente no nosso caminhar conhecedor

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Os panos


Visitante nove mil e nove, espelhar na visita.
A visita que fiz ao amigo moldureiro.
Dois pedaços de tecido já pintados e grafados já estão em suas mãos a espera da colocação das madeiras que lhes darão suporte.
Esperam por um bom trabalho, algo que faça com que suas aparições sejam mais sustentadas na verticalidade da mostra.
É uma espécie de gosto.
É uma espécie de rosto.
É uma espécie de espelho refletindo os sinais.
É o de nós sempre posto.
É brilhante e é fosco.
É uma espécie sem vinco é o menos e mais.
Cantarolava isso antes de chegar em casa.
Logo após ter deixado ao largo, os panos.
Uma pessoa, duas, duas faces, humanos, dois cavalos.
Parece-me uma guerreira, algumas, seu dogma posto.
Asas para que te quero?
As cabeças selvagens já descansam numa fisionomia menos feliz, aquela que está estampada naquele que nem de moldura precisa, já que acontecerá na própria parede.
Assim testamos as vinhas, as uvas, os frutos marcados nos panos achados recheados.
Já foram forro de banco em seu teto.
Não desses bancos que usamos para sentar.
Mesmo esses nos são caros, afinal nos colocamos a disposição, recheados com a graça da contemplação.
Daqui de longe vemos o aquário, de perto, sabemos como água fora dos potes

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Receitas a pé


A gente toma um remédio à noite porque ele provoca dores musculares.
Eita frasezinha esquisita que apenas mostra a nossa própria esquisitice.
Quando escrevo a nossa, quero dizer: a minha.
Os tais efeitos colaterais, muitas vezes estão esparramados por todos os meus lados.
Um dos efeitos da minha esquisitice é sempre querer ser efeito, provocar um efeito, ou muitos deles.
Efeito.
Fazer, fazer e fazer mais e não fazer porque o cartaz da faculdade diz: que a gente é aquilo que a gente faz, mas também por isso.
Afinal, a gente é isso mesmo, assim como a filosofia interpreta as coisas que são feitas, a gente aproveita e inventa a nossa filosofia de fazer a transformação.
A mesma instituição de ensino, prega em outro cartaz: Seu futuro sem improviso.
Que chato.
Meu futuro, meu passado e principalmente o meu presente eu quero cheio de improvisos, assim como a cena mais linda do filme do pirata, onde um dos dois soldados mais engraçados diz para o outro:
Ele faz isso planejado, ou improvisa?
Ele sabia que o tal pirata vive de improvisar com graça e poesia, tendo como efeito colateral, mais graça e poesia ainda.
No mesmo filme a mocinha tem uma pequena falha num dos dentes mais no fundo da boca.
O que prova que mesmo na boniteza existe um improviso que faz a diferença necessária à curiosidade.
Ensina-me muito e sabes bem disso, de tal forma que a sua forma de encarar as coisas de forma menos improvisada, me oferece a cartela de cores, para que eu salte do pano à mancha, fazendo florescer na junteza dos nossos sinais a nossa retórica oportuna e bela.
Receitas de doce devem ser seguidas à risca e as dos salgados permitem mais improvisos.
Assim caminhas ensinando-me a rechear as panquecas.
Rechear é uma das múltiplas sabedorias do seu receituário

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Bem hoje


Bem hoje e a pouco lembrei-me de uma notícia particular dita na manhã de ontem.
Ela dizia sobre a morte de uma aluna que estava frequentando o primeiro ano do curso feito na faculdade onde sempre desejou estudar.
O coração.
O coração da menina e o da questão.
Fomos desenhar com flores, eu e minha mãe, um coração sobre a grama que hoje cobre a história do nosso pai.
O do pai já havia feito surpresa ao parar de bater ao lado dela.
O coração e a sua beleza.
Os desenhos tenho guardado, assim como no coração do cérebro guardo as canções líricas em inglês e os textos allan poe, ficção fixada no crer das coisas.
Todos os traços tensos não tensionavam as figuras ditas nos rostos e corpos femininos.
O coração e sempre ele.
O nosso pai já respirava com surpresa quando já respirava novos ares no seu lirismo gracioso.
Bem hoje onde a vida marca presença, me lembro da notícia surpreendente.
A surpresa da morte faz.
O fazer transforma a nossa marca e marca-nos a testa e a fonte.
Façamos pois desse, o momento da corrida que começa na letra cê e espelha-se.
O resultado é um coração só, que não esquece.
Um só coração que alcança viver de dança e dança no viver dos nossos pés e dos nossos braços lembradores


Uma ilustração de Luisa Blascovi

Angélicos


Hoje é dia de celebrar a festa da vida que insiste.
Seu codinome morte, também resiste quando é chamada em plena existência vital.
A morte apelidada no erro, no tropeço, no dedão do pé inchado e no desrespeito a todos os outros que não nos são tão caros.
Existe dificuldade em seguir vivendo satisfazendo aquilo, que tantos outros que estão fora de mim necessitam.
Quando a nossa necessidade não é tão grande assim, a gente pode e deve viver observando reviver na surpresa daqueles que não somos nós mesmos.
Só podemos fazer surpresa para que não é a gente mesmo e assim, muitas vezes, somos surpreendidos.
Surpreendemos quando a nossa vida é um detalhe importante, abraçado à vida do outro.
O nosso abraço fortíssimo nos mostrou uma vida toda de aproximação, carinho e afeto, que estava andando essencialmente junto com os nossos dias, os lindos e os não tão lindos tanto.
Carregados somos com uma energia que assemelha-se àquela da rosa, do jasmim, das folhas, da ovelha e das garças.
Hoje é dia de celebrarmos aquela vida que é essa, é bonita e é também essa, que ainda será mais vida em abundância.
Inspiramos, expiramos e - relaxados na dor - respiramos levitando, na eterna conversa com os anjos